O termo profilaxia, em medicina, é usado para designar o conjunto de medidas direcionadas à prevenção de doenças e outras intercorrências que possam emergir de determinado procedimento médico. A palavra, derivada do grego prophylaxis, significa cautela, precaução. Atualmente, no entanto, a atividade médica deve observar e adotar condutas profiláticas não apenas em atenção à saúde do paciente, mas também com o objetivo de evitar, ou minimizar, os riscos legais advindos do nobre labor.
É a profilaxia legal, ou seja, a cautela que se traduz em observar disposições legais e realizar procedimentos jurídicos preventivos visando à minoração dos riscos e extensões da responsabilidade civil do médico. Tal conduta preventiva é importante e essencial em tempos que banalizada está a propositura de indenizações em face deste profissional.
Quem exerce a medicina deve ter em mente a dificuldade que permeia a produção das provas nas demandas judiciais centradas na responsabilidade profissional do médico. Isto se dá não apenas pela complexidade da matéria, mas também pela malsinada inversão do ônus probatório, comum em tais litígios, e que impõe ao médico, ainda mais, a necessidade de se adotar toda e qualquer conduta jurídico-preventiva.
Exemplo prático da profilaxia legal está na adequada e diligente documentação de todos os procedimentos exercidos pelo médico, que se materializa através da elaboração de um bom prontuário, bem como pela correta formalização do consentimento de pacientes submetidos a determinadas intervenções médicas.
Relativamente aos prontuários, é preciso que os profissionais da medicina se conscientizem da necessidade e importância de um documento bem elaborado, sua detalhada confecção e, agora, obrigatória legibilidade. Por mais acertados que sejam os diagnósticos, o tratamento, ou a técnica utilizada, sem a devida documentação fica o profissional exposto a riscos e dificuldades.
No tocante ao Termo de Consentimento Informado, duas considerações merecem destaque nesta sintética abordagem. A primeira corresponde à necessidade de que referido termo seja redigido com informações claras, didáticas e esclarecedoras, devendo ser analisado juntamente com o paciente. Como bem lecionou o Professor Luiz Fernando Pereira, no 01º Fórum Jurídico de Direito à Saúde da OAB/PR, é um processo de conscientização e anuência que deve evoluir de modo que efetivamente cumpra o seu papel, tratando-o como verdadeiro procedimento de informação e consentimento.
O Superior Tribunal de Justiça já teve a oportunidade de analisar o dever de informação dos profissionais da medicina. O Ministro Ruy Rosado de Aguiar, em uma dessas ocasiões, consignou que “(...) a obrigação de obter o consentimento informado do paciente decorre não apenas das regras de consumo, mas muito especialmente das exigências éticas que regulam a atividade médico-hospitalar, destacando-se entre elas o consentimento informado” (RESP 467.878/RJ, 4ª Turma, Rel. Min. Ruy Rosado de Aguiar, DJ de 10/2/2003).
O efetivo esclarecimento ao paciente decorre também, como se vê na jurisprudência, de imperativo legal, pois pacificada está a aplicação do Código de Defesa do Consumidor à relação médico-paciente, o que impõe a devida e correta informação. O dever do médico de informar ao paciente sobre as conseqüências de determinada cirurgia não se confunde, portanto, com singelas considerações escritas em relação ao ato operatório.
O segundo destaque consubstancia-se no fato de que a elaboração, ou não, de um Termo de Consentimento Informado significa, muitas vezes, a diferença entre a procedência ou improcedência da indenização pleiteada, o que se extrai da Ementa proferida no julgado acima citado: “A Santa Casa, apesar de ser instituição sem fins lucrativos, responde solidariamente pelo erro do seu médico, que deixa de cumprir com a obrigação de obter consentimento informado a respeito de cirurgia de risco, da qual resultou a perda da visão da paciente”.
Da mesma forma, no julgamento do Recurso Especial n.º 436827/SP, ficou expressa a importância do documento: “A despreocupação do facultativo em obter do paciente seu consentimento informado pode significar - nos casos mais graves - negligência no exercício profissional”.
Em contrapartida, a mesma Corte Superior reconheceu e valorizou a correta formalização do consentimento, consoante manifestado no voto da Ministra Nancy Andrighi, no Recurso Especial n.º 1180815 / MG: “age com cautela e conforme os ditames da boa-fé o médico que colhe a assinatura do paciente em termo de consentimento informado, de maneira a alertá-lo acerca de eventuais problemas que possam surgir durante o pós-operatório.”
O médico não deve medir esforços no sentido de se resguardar preventiva e juridicamente contra eventuais e possíveis imprevistos que o exercício da medicina impõe, não apenas em virtude da banalização das demandas médicas, mas também em razão das inúmeras disposições e alterações legislativas que regulamentam a profissão. É certo que a maioria dos médicos tem a exata ciência do que foi acima abordado e da necessidade de se observar as medidas elencadas. Contudo, não são poucos os que encontram dificuldades em exercitar este conhecimento e efetivamente colocar em prática as devidas cautelas legais, aumentando, assim, os riscos provenientes de sua atuação profissional.